quarta-feira, 10 de novembro de 2010

mães deixo ou fico com meu filho

 Fernando Martinho

Você está com a colher na mão, pronta para dar a papinha a seu filho, mas ele não abre a boca até a babá aparecer. Pela terceira noite seguida, a menina pede que o pai, só ele, leia o livro predileto dela antes de dormir. A empregada prepara a criança para ir à escola e faz uma "linda" maria-chiquinha – que obviamente você faria melhor. Seu filho telefona e diz que quer mostrar os trabalhos que trouxe da escola, mas, como você vai chegar tarde, ele decide mostrar tudo para a avó mesmo. Socorro! Se você se reconhece essas situações e sabe bem o sentimento que elas provocam, acredite: você é normal. Não há nada mais natural que sentir ciúme do filho. O problema é passar do limite.

Segundo o médico Eduardo Ferreira-Santos, do Instituto de Psiquiatria da USP e autor do livro Ciúme – O Medo da Perda (Editora Claridade), a confusão começa quando o ciúme é interpretado como prova de amor, segundo ele uma tendência de comportamento dos latinos. O médico pesquisou o tema em vários países e viu que, nos Estados Unidos, por exemplo, há muitos estudos científicos sobre o assunto. "Para o americano, viciado em direitos individuais, a pessoa que recebe o ciúme se sente invadida e isso é uma grande ofensa", explica. No Brasil, no entanto, o especialista avalia que não se encara o ciúme como um problema tão grave. "Talvez por causa da maneira como vivemos esse sentimento. Para nós, brasileiros, sentir ciúme faz parte do amor."

Dispensável? Eu!?

Quando a criança cresce, enxergar o limite desse amor pode ser ainda mais difícil. Você fica feliz quando percebe que seu filho é sociável, fica bem na casa dos outros, adora conversar, sorri para todos. Mas, ao mesmo tempo, pode sentir um vazio. Como se fosse uma perda – se, antes, tudo exigia a mamãe por perto, agora a criança se comporta como se a deixasse de escanteio. Não é bem assim. Claro que seu filho não vai mesmo precisar de ajuda em algumas situações – o contrário, sim, seria um problema –, e isso faz parte do amadurecimento da criança. Eduardo Ferreira-Santos explica que o desafio é compreender que o filho tem vida própria. "A arte de ser pai é saber ser dispensável." É quando a mãe se dá conta de que tem mais deveres do que direitos.


Sentir ciúme exige uma reflexão constante. A dona-de-casa Ana Cristina Santos Alfieri, 42 anos, às vezes se pega pensando se está ou não exagerando na dose com o pequeno Marco, de 7 anos. "O filho é tudo para a gente e, quando precisamos soltá-lo para o mundo, é muito difícil mesmo", confessa ela. "Eu assumo: acho que o que eu sinto pode ser ciúme, sim." Ana Cristina conta que certa vez uma professora a repreendeu na escola. Ela não lembra o porquê da "bronca", mas guardou bem o que ouviu: "Você precisa deixar seu filho crescer!" "Minha única reação foi olhar para ele, na minha frente, chupando chupeta, e pensar: como assim?"


A terapeuta familiar Sílvia Van Enck Meira analisa que a mãe vive um dilema. De um lado, está a tranqüilidade de que o filho esteja sendo bem cuidado, do outro, a "raiva" da professora que ensinou algo "no lugar dela". "A mãe deve entender que a criança vai continuar vivendo bons momentos ao lado dela também, desde oportunidades de aprendizado até gracinhas e carinhos", salienta a especialista. Mas nem sempre é fácil. Para a baiana Jacqueline Menezes, 25 anos, está complicado ser uma mãe do tipo bem-resolvida. Após os quatro meses de licença-maternidade, ela precisou deixar a filha, Beatriz, hoje com 1 ano e 4 meses, na casa da família do marido para trabalhar. Hoje, suspeita que a menina goste mais dos cuidadores do que dela própria. "Para mim, Beatriz não faz festa, mas quando vê a tia, ela ri sem parar! Às vezes, fico com muito ciúme e penso que, quando minha filha crescer, vai querer morar com eles", lamenta. Jacqueline reclama que lhe sobra apenas a hora da bronca e dos afazeres de casa. Sílvia Meira acha que o ideal é a mãe delegar o que puder em troca de momentos de aconchego com o filho. "São esses momentos que criam um vínculo forte entre a mãe e a criança. E, com esses laços fortificados, a mãe vai ter certeza de que ninguém, nunca, vai tomar o seu lugar."


 Fernando Martinho

Dose certa

Sentir ciúme do filho é normal, mas, como todo sentimento, em exagero pode atrapalhar a formação da personalidade da criança. "Se ela for introvertida, pode ficar sempre esperando que a mãe a proteja e, por toda a vida, vai procurar o mesmo modelo nos outros relacionamentos. Mas as crianças extrovertidas se sentirão sufocadas e reagirão com rebeldia a qualquer tipo de proteção", esclarece Ferreira-Santos. Segundo ele, são formadas personalidades frágeis e as conseqüências maiores surgem na adolescência, quando as relações sociais ganham mais importância.

Não há problema em se solidarizar com Ana Cristina Alfieri, que, quando Marco chega contando algo que adorou fazer na escola, logo pensa: "Ah, queria ter estado junto dele nessa hora". A dica é entender que outras pessoas cuidarão de forma diferente, mas sempre sob sua orientação. "A mãe precisa de ajuda para perceber que passou do limite e quem pode melhor sinalizar isso é o marido", ensina a terapeuta Sílvia Meira. Converse, desabafe com amigos, com a família e, se precisar, procure um especialista. O recado principal é: não sofra, porque ninguém vai tomar o seu lugar
os creditos desta postagem pertecem a revista crescer

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